quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Comida e cerveja


Como postei um artigo sobre vinho, algumas pessoas comentaram que gostariam de ler sobre cerveja. Eu já tinha um artigo sobre cerveja, então aí vai...


Tenho uma dificuldade em escrever títulos. Esse de hoje dá a entender qual comida que vai bem com cerveja, mas na verdade não é. Primeiro porque, pra mim, nenhuma comida merece isso. Segundo porque o artigo de hoje tem a ver em como utilizar a cerveja na comida. Aí sim pode criar combinações incríveis.
Eu não bebo cerveja.
'Como não?' Muitos me perguntam já tirando um sarro. Eu já me acostumei com isso. Pra muitos, beber cerveja é coisa de macho, ou de brasileiro, ou simplesmente porque todo mundo bebe, a resposta mais burra e triste que eu já recebi quando pergunto isso a alguém. E eu, que não bebo, sou o estranho. Sou estranho mesmo, só que jamais vou ficar segurando uma latinha para parecer igual aos outros.
Não bebo porque não gosto e porque não preciso de álcool para relaxar ou ficar alegrinho. Claro que respeito quem bebe, só que não me encha o saco, por favor!
Mesmo não gostando, acho uma bebida incrível. O proccesso de fermentação, a escolha dos ingredientes e as significativas alterações no produto final, a linda coloração dourada e as minúsculas bolhas que formam a espuma realmente me fascinam.
Criada a mais de 4000 anos antes de Cristo, essa bebida faz parte da história de muitos países. Na Alemanha, em 1516 foi criada uma regra de preparação que acredita-se ser a primeira a tratar de alimentos.
Diz a norma que os únicos ingredientes permitidos na fabricação da cerveja são: água, lúpulo e cevada-malte.
'Ué, mas não é assim que se faz cerveja?' Teoricamente sim.
Analisando o rótulo de uma cerveja popular encontrei: água, malte de cevada, lúpulo. Até aí tudo bem. Mas também continha: cereais não malteados, carboidratos, antioxidante (INS 316) e estabilizante (INS 405).
Os carboidratos não são especificados e os INS 316 e INS 405 tem um nome tão assustador e misterioso que pode matar um alemão de desgosto.
Os cereais não malteados utlizados pelas indústrias são arroz e milho, grãos muito mais baratos que a cevada e que, na verdade, fazem a cerveja render mais. Em contrapartida, a sua cerveja tem menos sabor. Mas quem liga pra isso? Os grandes fabricantes de cerveja porcaria induzem todos a beber a cerveja geladíssima, estupidamente gelada, abaixo do zero e blábláblá. Sabe o porquê?
Porque alimentos gelados anestesiam os sensores gustativos, ou seja, tudo muito gelado tem menos gosto do que numa temperatura superior.
A temperatura ideal para beber cerveja é 6ºC. Ah, você acha que a cerveja tem um gosto ruim quando servida “quente”? É porque esse é o real gosto da sua bebida.
Quando tinha o restaurante, coloquei três cervejas de qualidade no menu. Para cada 50 cervejas porcarias eu vendia 1 cerveja de qualidade. E tinha ainda que ter uns exemplares no freezer, além das que ficavam na geladeira, porque sempre tinha um idiota que pedia a cerveja de qualidade “trincando”.

Isso me lembra uma moça que colocou adoçante no vinho tinto. 'Ai, esse vinho está seco demais!' Juro que é verdade.
Ainda bem que existem pequenas empresas que fazem cervejas de qualidade. São um pouco mais caras, mas pra cozinhar são incomparáveis e para beber eu não sei, mas pelo menos os cervejeiros colocam uma boa dose de carinho nos seus produtos. Aqui em Mogi é fácil achar cervejas nacionais de qualidade da marca Baden Baden e Eisenbahn, além de algumas importadas. Na dúvida, leia os ingredientes.
Na comida, grande parte do álcool vai embora com o cozimento e o que fica é o sabor profundo e intenso do malte respaldado por um agora sutil amargor proveniente do lúpulo.
Experimente trocar a água da receita do seu pão por cerveja e você entenderá o que eu quero dizer.
Mais fácil ainda, frite cebolas em rodelas em manteiga até amolecerem e ficarem escuras. Salpique um pouco de farinha de trigo, mexa um pouco e adicione uma boa cerveja preta. Tempere e você terá o melhor molho para acompanhar salsichas ou linguiças frescas.

Receita de hoje
Sopa de cerveja pilsen

Ingredientes
1 garrafinha de creme de leite fresco
500g de cebola em cubinhos
400g de cenoura em cubinhos
100g de alho poró em fatias
2 colheres de manteiga
ervas frescas de sua preferência
350mL de cerveja pilsen de qualidade
150g de parmesão ralado na hora (não daqueles saquinhos com gosto de vômito)
150g de provolone (bem molinho) ralado
pimenta do reino branca

Esquente a manteiga numa panela e refogue os legumes até murchar. Adicione 1 litro de água, as ervas e ferva lentamente por 30 minutos.
Coe o caldo e volte o líquido para a panela. Reduza pela metade, adicione o creme de leite e ferva por uns dois minutos.
Retire a panela do fogo e adicione os queijos.
Bata no liquidificador, volte a sopa para a panela e adicione a cerveja, Tempere com pimenta do reino branca e sal, se necessário.
Esquente sem deixar ferver e sirva com torradas e para beber....cerveja né!

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

A Índia que vivi



Hoje vou relatar a experiência que tive ao viver com indianos.
Nunca vi um capítulo da novela das oito que acabou de acabar, mas sei que por causa dela a Índia está na moda.
Também por influência da novela vários livros sobre os indianos surgiram no mercado, e na semana passada acabei de ler um livro sobre a cultura, comida e tradições do segundo país mais populoso do mundo.
Só depois de ler entendi por que os indianos nos tratavam de forma diferente na escola em que estudei na Suíça. Não todos, mas a grande maioria dos indianos hindus considerava nós, os ocidentais, o lixo do mundo.
Havia em torno de 20 indianos estudantes de hotelaria na escola, entre 150 de outras 43 nacionalidades. Assim, eles eram um grupo forte e impenetrável na nossa pequena Torre de Babel.
Para os hindus existem regras de preparo nas refeições. Um estrangeiro comedor de carne de porco e vaca não podia tocar na comida e, como eles achavam a comida da escola impura, cozinhavam nos seus quartos todos os dias.
Eu morava no terceiro andar e um indiano morava logo abaixo de mim. Todo dia ele cozinhava e o aroma de sua comida subia com intensidade.
Os condimentos fortes misturados com cheiro de fritura faziam a gente morrer de vontade de comer aquela comida, mas isso nunca aconteceu é claro.
Havia também no curso uma indiana muçulmana, mais flexível que os demais, mas mesmo assim muito invocada. Era a única que estudava gastronomia.
Um dia, no ramadã, ela estava exausta após uma aula e resolveu que aquele dia ela iria quebrar o jejum e comer carne.
Um silêncio incômodo pairou sobre o ambiente enquanto ela, decidida, resolveu chutar o pau da barraca de vez.
Acreditávamos que o ramadã era cumprido á risca por todos, mas depois caímos na real e percebemos que os muçulmanos são pessoas normais, como nós, diferentes dos radicais que sempre vemos na televisão.
Havíamos cozinhado aquele dia vitela, porco e cordeiro. Os pratos estavam na mesa e ela perguntou qual deles era composto por vitela. O estudante que preparou vitela aquele dia apontou os pratos e disse ainda que estava muito orgulhoso de seus pratos.
Ela escolheu um filé alto ao molho de chocolate e se acabou de comer. Vi que estava um pouco mal passada, mas não falei nada, achei que ela gostasse assim.
Alguns instantes depois o Chef apareceu com as críticas dos pratos realizados naquele dia. A primeira coisa que ele disse é que todas as carnes estavam fora do ponto: a vitela e o cordeiro passado demais e a carne de porco mal passada.
A menina esbugalhou os olhos na hora e o estudante que indicou os pratos de vitela ficou desesperado! A garota havia quebrado o ramadã e comido carne de porco mal passada, alimento que ela não come nem fora do jejum!
Uma pequena briga foi logo apartada pelo pedido de desculpas do estudante que se enganou e tudo voltou ao normal.
Mais tarde, chamei a menina de lado e perguntei se ter comido carne de porco havia valido a pena. Em segredo ela me confessou que sim, que estava delicioso, mas que não podia dizer isso para ninguém.
Alguns indianos, ao final do curso, acabaram se “ocidentalizando” e se tornaram mais acessíveis. Se vestiam como nós, respeitavam nossas culturas e comiam de tudo. Diziam que nunca mais voltariam à Índia, país de que tinham muito orgulho antes de provarem a vida ocidental.
Respeito todos eles, primeiro porque não se pode classificar a tradição e cultura de um povo como certo ou errada e segundo porque adoro comida indiana...

Receita de hoje
Ingredientes
1 xícara de lentilha
2 batatas médias
1 colher pequena de curry
Pimenta-do-reino
Sal
Manteiga
Cozinhe a lentilha e as batatas em água até começarem a desmanchar.
A consistência deve ser de um ensopado bem mole. Adicione mais água se for preciso.
Numa frigideira, frite o curry e a pimenta do reino na manteiga (sinta só o aroma!) e despeje no ensopado. Tempere com sal e sirva com pão.

Vinhos



Não bebo álcool, mas experimento todo vinho que posso.
Além de fazer parte da minha profissão, gosto de desenvolver meu paladar e saber utilizar determinado vinho para harmonizar com um prato meu.
Dentre as bebidas alcoólicas, o vinho é a que mais está diretamente ligada à comida.
Muita gente bebe cerveja ou whisky sem comer nada, mas o vinho sempre pede um acompanhamento, mesmo que apenas um pedaço de queijo.
Acho que a vontade que as pessoas têm de comer alguma coisa quando bebem vinho se dá pela variação de sabor que ele sofre conforme a comida que se põe na boca. É uma bebida que se transforma, que muda conforme o que se ingere junto, conforme a temperatura, taça, a exposição ao oxigênio e por aí vai.
Além disso, a variedade encontrada no mercado é quase infinita e assim sempre vai haver uma busca, até inconsciente, do vinho ideal. É um comportamento natural do ser humano.
Tive esta experiência com o café expresso. Há inúmeras variedades e métodos de extração do líquido. Ganhei do meu irmão a máquina que hoje é considerada a melhor do mundo. Depois de algum tempo achei o meu café ideal e hoje tenho o melhor café do mundo (meu mundo) em casa, quando quiser.
Sabe que isso meio que me desanimou! Acabou a minha busca porque sei que o café que tomarei em qualquer lugar do mundo não será melhor que aquele que eu tenho em casa!
Atualmente há uma grande discussão sobre harmonização do vinho com a comida.
É difícil errar ao combinar apenas um ingrediente com um vinho, mas uma tendência atual na gastronomia pede o contraste de sabores, então uma refeição pode ter um filé mignon, uma espuma de manga verde e um bolinho de massa de arroz cozido em shoyu e molho de ostra. Acredite em mim, esse prato pode ser uma delícia, mas qual vinho irá acompanhar tamanha variedade de sabores?
Além do mais, nos grandes restaurantes há menus de 4, 5 e até 8 pratos. Como harmonizar uma refeição inteira dessa com o vinho?
Claro que isso até pode ser feito, mas ao oitavo prato o cliente talvez estará dançando encima da mesa e com certeza não estará notando as características particulares de determinado vinho com determinado prato.
Assim, toda essa complexidade que se cria em torno do vinho pode ser exagerada. Deixe a discussão sobre a harmonização para os experts e aproveite um bom vinho sem se preocupar muito com suas características e aromas de folhas do outono no chão frio da floresta, ui!

Receita de hoje

Perna de cordeiro assada ao alecrim

O clima frio combina muito bem com esse prato forte e substancioso. Para acompanhar, um vinho de inverno, ou seja, um vinho encorpado, que fará você ter mais vontade de comer, depois mais vontade de beber, comer, beber, comer e beber até acabar o vinho!
Ingredientes

-1 pernil de cordeiro
-1 maço de alecrim
-1 cabeça de alho
-azeite
-sal
-pimenta do reino preta

Fure o pernil em vários lugares e insira bastante alho, alecrim e pimenta do reino.
Esquente uma panela larga que caiba o pernil e besunte a carne com azeite.
Quando a panela estiver bem quente doure o pernil por inteiro, virando algumas vezes.
Tempere com sal e leve ao forno pré-aquecido a 220°C por uma hora.
Ele vai estar mal passado por dentro, mas é assim que ele fica melhor. Se quiser mais passado, deixe mais tempo mas abaixe a temperatura.
Sirva com batatas assadas.